Pague primeiro e descubra o que comprou depois: loja em SP tem filas de consumidores em busca de ‘surpresas’
Na Galpão da Reversa, produtos ficam escondidos em sacos e caixas que custam R$ 50 cada. Compras às cegas podem revelar desde celulares a cacarecos, como alimentador para gatos

A babá Patrícia Ribeiro encarou duas horas e 20 minutos de ônibus na folga do trabalho, na última terça-feira, para tentar comprar um celular por R$ 50. Saiu do Capão Redondo, na Zona Sul de São Paulo, rumo ao bairro da Lapa, na Zona Oeste. Ali funciona o Galpão da Reversa, uma loja aberta no fim de dezembro com um conceito curioso: os produtos ficam escondidos em sacos e caixas pretas lacradas, de forma que você só saberá o que comprou após fazer o pagamento — cada embalagem surpresa custa R$ 50 — e ir embora do local. O cliente tem só cinco minutos para escolher os pacotes desejados.
Com mais de 200 mil seguidores nas redes sociais e outras duas unidades no interior paulista, o empreendimento tem feito sucesso. A primeira loja, na cidade de Atibaia, abriu as portas em novembro. O outro espaço, em Sorocaba, no início de dezembro.
As inaugurações tiveram longas filas e, aos finais de semana, a unidade da Lapa — construída como um anexo de uma loja da rede varejista Vestcasa, perto da Marginal Tietê, uma das mais movimentadas avenidas da cidade — chega a ter uma centena de clientes na porta, à espera da próxima sessão de cinco minutos de “caça ao tesouro”.
Nas postagens virtuais, o Galpão da Reversa não economiza na propaganda: “já teve gente saindo daqui com Macbook, JBL, tablet e muitos outros prêmios”. Mas avisa: “(Os itens) podem ter avarias, caixas danificadas ou peças faltantes”. As fotos mostram pessoas felizes com os eletrônicos adquiridos, tipo de item que atrai a maior parte da clientela.
Os interessados esperam fora da loja enquanto funcionários reabastecem os cestos com novos produtos ao fim de cada rodada. Na tarde de terça, quando a reportagem esteve na unidade da Lapa, 20 pessoas aguardavam na fila.
Alerta para golpe
Antes do início de cada round de compras, um funcionário anuncia as regras. “Os pacotes vêm de vários lugares, são de logística reversa, (produtos) que o cliente devolveu (à fabricante) e por algum motivo não foi entregue. Quem decidir entrar precisa levar pelo menos um pacote, é a regra do jogo. Cada um pode comprar quantos pacotes quiser. Saquinho rasgado não passa no caixa”, ele anuncia, com voz enérgica.
— Conheci o lugar pelo Instagram. Quero encontrar um celular, com certeza. O meu quebrou — diz Catarina Chechetto, de 13 anos, acompanhada da mãe e de uma amiga da família. — Adolescente gosta de novidade. Quem sabe eu economizo um celular, ela quebrou a tela faz um mês — diz a mãe, a psicóloga Raquel Chechetto.
Liberada a entrada, outra funcionária, de microfone em punho, anima os participantes. “Mãos para cima! Todo mundo, mãos para cima. É (no mínimo) um pacote por pessoa. Boa sorte! Galpão da Reversa, o galpão mais famoso. São as comprinhas do Mercado Livre, Amazon… Lembrando, não temos loja on-line! Cuidado com o golpe”, ela diz. Em seguida, anuncia que a rodada está valendo, depois segue avisando os participantes sobre o tempo que resta.
Os clientes podem chacoalhar e apalpar os itens à vontade — só não podem abrir as sacolas. A loja disponibiliza um cesto e alguns acumulam três ou quatro caixas surpresa.
— Roupa e sapato você sente de monte (dentro dos sacos) — diz a babá Patrícia Ribeiro, que queria um novo celular.
Decepção com ‘alimentador para gatos’
Ao final dos cinco minutos, os clientes são conduzidos aos caixas. Patrícia não encontrou o sonhado smartphone. Gastou R$ 200 em quatro pacotes. Vieram cuecas, um conjuntinho para ginástica, fone sem fio, massageador, um pequeno aparelho para selar sacos plásticos, lanterna recarregável e outros cacarecos. O item mais valioso parece ser um alimentador automático para gatos.
— Fiquei decepcionada. Pelo Instagram, você vê caixas com drones, celulares, computador — diz Patrícia, que pretende revender o alimentador de gatos para reaver o dinheiro gasto.
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Raquel e a filha Catarina também não conseguiram o sonhado celular da adolescente. Em duas caixas, por R$ 100, vieram roupas, acessórios, um secador para cabelo, fone de ouvido e outros itens. A amiga da família, Marina Martins, também encontrou roupas e mais cacarecos em seu pacote.
— Acho que valeu a pena a brincadeira. Foram bobeirinhas, mas coisas que ela (Catarina) gostou. Ela pegou um fone (sem fio), um colar bem bonitinho, e um desses secadores que estão na moda. O secador a gente pensou até em tentar vender para brincar mais (com o dinheiro). Seria ótimo ter conseguido um celular — comenta Raquel.
Produtos de Amazon, Shopee e Mercado Livre
A empresa afirma que os itens vêm de “logística reversa” de empresas como Mercado Livre, Amazon, Shopee e outros sites. Ou seja, são produtos que seriam devolvidos a esses e-commerces. O Galpão da Reversa não concedeu entrevista ao GLOBO, mas respondeu a perguntas por escrito
Confira a entrevista acessando o site de O Globo no link a seguir