Nas Entrelinhas

São Gabriel da Cachoeira quer melhor atuação dos órgaos de fiscalização e monitoramento na questão dos garimpeiros

Marivelton Barroso,da Federaçãao das Organizações Indígenas do Rio Negro diz que com essa inoperância, não só o garimpo, mas o narcotráfico acontece na região

Marivelton Rodrigues Barroso é presidente da FOIRN que represnta 23 etnias da região do Rio Negro – Foto Paulo Desana/Rede Wauyri

Diante da crise humanitária dos yanomami, as atenções estão voltadas para os povos originários. Marivelton Rodrigues Barroso, da etnia Baré, natural do município de Santa Isabel do Rio Negro, presidente da Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro — FOIRN, falou à reportagem do portal Zona Franca. Fundada em 1987, a FOIRN representa vinte e três povos indígenas do Rio Negro, numa área que abrange os municípios de Barcelos, Santa Isabel do Rio Negro e São Gabriel da Cachoeira, no Amazonas. É uma associação civil reconhecida como de utilidade pública pela lei 1831/1987 e uma das principais organizações do movimento indígena no Brasil, sendo referência mundial na defesa dos povos indígenas na América Latina.

PZF — Como tem sido a atuação da FOIRN na região do Rio Negro no que se refere à defesa dos povos originários?

Marivelton — A FOIRN, como sua missão, tem a defesa dos direitos coletivos dos povos indígenas que habitam a região do Rio Negro no noroeste amazônico. A organização continua exercendo o seu papel e a sua representação contra atividades ilegais na região que ferem e não respeitam os direitos assegurados constitucionalmente.

PZF — A exploração do garimpo ilegal tem atuação por aqui. Em qual área ela ocorre e quais providências têm sido tomadas no sentido de coibi-la?

Marivelton — Na região, falta uma atuação melhor dos órgãos de controle, também de fiscalização e monitoramento do território. Com essa inoperância, não só o garimpo, mas também o narcotráfico acontece na região.

PZF – Se tem garimpeiro na área, poderia informar qual a quantidade?

Marivelton – A quantidade exata não se sabe ainda, mas, pelos relatos de parentes indígenas de comunidades da região e das organizações, sabemos que tem em diferentes áreas, como na TI Yanomami, no antigo garimpo tukano, entre outras localidades de nossa região.

PZF — Garimpeiros saindo de Boa Vista podem chegar a São Gabriel?

Marivelton – Na semana passada, estávamos com o presidente da Associação Yanomami Ayrca e fomos à

Maturacá e Ariabu. Após essa viagem e conversas com os nossos parentes, tem registro de garimpeiros chegando ao pico da neblina. Chegamos a mandar carta conjunta ao MPI, Funai e MPF sobre a situação que muito nos preocupa, uma vez que não é só com os garimpeiros que chegam, mas com a chegada de maquinários.

PZF – Considera-se que muitos minerais já foram subtraídos das áreas indígenas por aqui?

Marivelton – Já, devem ter saído bastante com essas operações ilegais que tem na região.

PZF — De que modo os indígenas estão garantindo o seu sustento?

Marivelton – Na região, como você é conhecedor, aqui temos as atividades produtivas de consultivo de roça, pesca, caça e algumas iniciativas de produção e comercialização de artesanato, iniciativas de turismo em terra indígena. Mas ainda falta melhorar o incentivo e poder ter as políticas de mercados institucionais melhores investidas, como o PNAE e PAB, para que se possa garantir uma boa economia indígena da região através do seu sistema tradicional agrícola da região.

PZF — Como estão vivendo os indígenas do Alto Rio Negro, o que plantam, o que produzem?

Marivelton – O Rio Negro mantém o seu sistema agrícola tradicional. Esse rio está reconhecido como patrimônio imaterial dos vinte e três povos dessas regiões, reconhecidas em 2010, a pedido da ACIMRN e FOIRN, devido a suas roças, plantas cultivas e seus conhecimentos associados. Em período referente ao levantamento, se mostrou a região com grande potencial produtivo de roças através de sua própria agricultura indígena.

PZF — A saúde tem sido atendida pelo governo federal?

Marivelton – Nos últimos anos, continuou sendo ofertada não da melhor forma ou maneira. A perspectiva, agora, é melhorar cada vez mais e reorganizar os serviços e a infraestrutura: transportes, equipes multidisciplinares, insumos e condições melhores aos trabalhos e atendimentos aos usuários com o efetivo controle social.

PZF – O movimento indígena tem atuado para indicar os diretores do DSEI e Funai?

Marivelton – As indicações dos coordenadores das duas autarquias partem do movimento indígena e serão nomeados tanto para a coordenação regional da Funai no Rio Negro (pela primeira vez, será uma mulher) – Maria do Rosário Piloto Martins ( Dadá Baniwa),quanto para coordenador distrital de saúde indígena do Alto Rio Negro  o indicado foi  Luiz Barzão dos Santos Baré

PZF – Qual a situação desses órgãos do ponto de vista da estrutura?

Marivelton – Precisam se reorganizar, se reestruturar e formar uma boa equipe de gestão e de frente de trabalho.

No caso, o DSEI precisa de local próprio e não pode ficar só em aluguel. Precisa de uma estrutura que comporte a sua necessidade para o seu pleno funcionamento.

PZF – A TIs homologadas estão de acordo com o que pensam os povos originários da região do Alto Rio Negro?

Marivelton – As terras indígenas já homologadas são garantia de proteção, também de nossa sobrevivência física e cultural, correspondem aos nossos anseios e à garantia para as próximas gerações. É devido a isso que também se manteve sempre intacta uma luta de anos de nossas antigas lideranças para conseguirem essa conquista através da FOIRN, que foi a demarcação e homologação das cinco terras indígenas do Alto e Médio Rio Negro. E segue em curso essa luta: duas terras na região do Baixo Rio Negro devem obter a homologação.

PZF – Como está a situação in loco de Maturacá, parte dos yanomami em São Gabriel da Cachoeira?

Marivelton – In loco verificamos que há muita necessidade de melhorar a qualidade de atenção à saúde. Precisamos de poços artesianos, aperfeiçoar o polo base de saúde e ter uma equipe ampliada para atender os parentes e melhorar a estrutura da unidade que vaza toda. Também há muita falta de medicamentos básicos, até mesmo para tratamento de verminose. De acordo com os líderes tradicionais, o principal igarapé está contaminado, condenado a não ser utilizado. É necessária uma atenção pública do governo para essa região no nosso estado do Amazonas.

PZF – Como está a relação dos indígenas de São Gabriel com o (governo) Lula, considerando que hoje foi criado o Ministério dos Povos Originários?

Marivelton – A relação com o governo tem se dado a partir da organização indígena no que tange às políticas para com os povos indígenas na região do Rio Negro (São Gabriel, Santa Isabel e Barcelos), através da FOIRN, em conjunto à Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira – COIAB e à Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB.

Recentemente, a Foirn manifestou preocupação com a movimentação desses garimpeiros de Boa Vista para a área de São Gabriel da Cachoeira, informando aos órgãos em Brasília e solicitando providencias temendo ocupações na região.

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