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Política

Análise: Bolsonaro entre a irrelevância e a influência nas Eleições de 2026

A análise da jornalista Julia Dualibi,publicada hoje(27) em O Globo, apresenta uma tese provocativa: Jair Bolsonaro estaria transitando de protagonista para coadjuvante no cenário político brasileiro, especialmente para as eleições de 2026. Contudo, essa avaliação merece um exame mais criterioso, considerando múltiplas dimensões do poder político.

Evidências do Enfraquecimento

Dados quantitativos consolidam o diagnóstico de desgaste:

A pesquisa Quaest revela trajetória preocupante para o ex-presidente. Sua rejeição saltou de 55% (maio) para 63% (outubro de 2025), enquanto sua capacidade de transferência de votos em regiões estratégicas caiu de 38% para 28%. Mais revelador ainda é o dado que apenas 13% se declaram bolsonaristas, contra 22% que se identificam como direitistas não-bolsonaristas. Os independentes representam 31% do eleitorado, mais que o dobro da base bolsonarista.

A crise de imagem recente agravou o quadro: O episódio da tornozeleira eletrônica, interpretado até por aliados como delirante, e as sucessivas polêmicas envolvendo sua família aceleraram o processo de desgaste. A prisão, paradoxalmente, foi recebida com alívio por setores do próprio campo bolsonarista.

Atenuantes e Contrapesos

A tese do “fim” de Bolsonaro, porém, apresenta fragilidades importantes:

Permanência da base mobilizada: Mesmo reduzidos a 13%, os bolsonaristas representam um eleitorado altamente engajado e disciplinado. Em eleições fragmentadas, essa base pode ser decisiva para definir quem avança ao segundo turno.

Vácuo de liderança à direita: Não há, até o momento, figura consolidada capaz de aglutinar todo o espectro direitista. Tarcísio de Freitas, principal aposta do Centrão, ainda precisa provar sua viabilidade nacional e construir identidade própria além da sombra bolsonarista.

Capital simbólico da perseguição: A narrativa de perseguição judicial, reforçada pela prisão, pode reconverter desgaste em mobilização entre sua base e simpatizantes. Historicamente, figuras políticas têm se fortalecido através do martírio político.

Poder de veto e sabotagem: Mesmo enfraquecido, Bolsonaro mantém capacidade de inviabilizar candidaturas que não lhe interessem. Sua eventual oposição a Tarcísio ou outro nome poderia rachar a direita e beneficiar a esquerda.

A Estratégia do Centrão

O cálculo político descrito por Dualibi é sofisticado: busca-se um Bolsonaro fragilizado o suficiente para não ditar as regras, mas forte o bastante para transferir votos no primeiro turno. A exigência de Michelle como vice e a promessa de indulto funcionariam como “pedágios” dessa aliança calculada.

Essa estratégia apresenta riscos evidentes:

Bolsonaro pode não aceitar o papel de coadjuvante e promover candidatura alternativa ou boicote

A associação com o bolsonarismo pode inviabilizar a conquista do centro no segundo turno

Michelle Bolsonaro como vice representaria herança política pesada demais

Cenários para 2026

Cenário 1 – Irrelevância Progressiva: Inelegibilidade confirmada, desgaste contínuo e emergência de nova liderança direitista consolidam Bolsonaro como figura histórica sem influência eleitoral decisiva.

Cenário 2 – Influência Determinante: Apesar do desgaste, Bolsonaro mantém poder de definir quem representa a direita e sua base disciplinada garante passagem ao segundo turno para seu escolhido.

Cenário 3 – Ruptura Controlada: Centrão consegue usar Bolsonaro taticamente no primeiro turno e descartá-lo no segundo, mas isso exige habilidade política extrema e pode gerar fragmentação.

Conclusão

Bolsonaro não é ainda carta definitivamente fora do baralho, mas também não comanda mais o jogo sozinho. Sua condição atual é de ativo político depreciado porém não desprezível.

A metáfora mais precisa talvez seja: Bolsonaro deixou de ser o “dealer” da mesa política para se tornar uma carta coringa — pode ter valor decisivo dependendo do jogo, mas também pode comprometer a mão de quem a possui.

O próximo ano será crucial para determinar se seu declínio é irreversível ou se, como já demonstrou antes, possui capacidade de rearticulação. A história política brasileira ensina que declarar mortes prematuras de lideranças populistas costuma ser exercício de risco.

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