Lixões na Amazônia contaminam água e recebem entulho e sofá velho mesmo após fechamento
Região Norte tem os piores indicadores de destinação inadequada de resíduos, e cidades em áreas sensíveis não conseguem dar fim a lixões e aterros improvisados
O lixão de Breves (PA), o maior município do arquipélago do Marajó, contamina nascentes e poços em uma cidade onde parcela expressiva da população não tem acesso a água encanada. Famílias que vivem próximas ao depósito de lixo, um pouco mais afastado da parte central da cidade, precisam recorrer a poços e podem estar consumindo água com algum nível de contaminação.
Em Ananindeua (PA), cidade colada a Belém, um lixão num bairro periférico recebia os resíduos domésticos da capital. O espaço foi interditado para esse tipo de resíduo, mas segue ativo e é o destino de entulho de construção, material de poda, móveis e sofás velhos da capital amazônica que será sede da COP30 (Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas) em 2025.
A maior cidade da Amazônia, Manaus, com 2 milhões de moradores, viu seu aterro controlado —uma estrutura sem proteção ambiental, mais próxima de um lixão do que de um aterro sanitário— esgotar a capacidade. Um acordo na Justiça permitiu a extensão do uso do lixão até 2028, inclusive com ampliação da área em 20 hectares. Enquanto isso, o município deve tratar gás e chorume e construir um aterro sanitário.
Na região amazônica está a maior quantidade de lixões do país, em termos proporcionais, e há menos coleta domiciliar de lixo. Essas estruturas rudimentares compõem o cenário da maioria dos municípios e parecem ser mais resilientes do que em outras partes do país, ocupando espaços altamente sensíveis à contaminação, tanto em termos de biodiversidade quanto de recursos hídricos.
Na letra fria da lei, todos os lixões precisam acabar até 2 de agosto de 2024, prazo que vem sendo empurrado desde 2014. Os municípios precisam dar disposição ambientalmente adequada aos rejeitos, o que na prática significaria acabar com os lixões e adotar aterros sanitários em prazos escalonados.
Esses prazos se mostraram irreais. Segundo dados aceitos pelo MMA (Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima), o país tem hoje mais de 1.500 lixões.
O último panorama dos resíduos sólidos no Brasil, elaborado pela Abrema (Associação Brasileira de Resíduos e Meio Ambiente), aponta que 38 % do lixo produzido no país tem destinação inadequada. A associação reúne empresas que atuam na área e considera aterros sanitários como destinos adequados, com impermeabilização, drenagem, monitoramento e tratamento do chorume (líquido produzido pela decomposição dos resíduos).
A região Norte tem os piores indicadores, conforme o relatório de 2023, que usa dados de 2022: 63,4% dos resíduos têm destinação inadequada, ou seja, são levados a lixões ou aterros controlados. Os dados usados pelo MMA confirmam o relatório da iniciativa privada: 68,9% das cidades no Norte têm lixões, e 10,2%, aterros controlados. É a pior proporção entre as cinco regiões.
Cidades amazônicas também sofrem mais com o serviço de coleta domiciliar de lixo. Dados do SNIS (Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento), do Ministério das Cidades, mostram que a coleta não chega a 20,8% das casas no Norte, também o pior indicador entre as cinco regiões brasileiras.
Em Breves, a coleta chega a menos da metade das casas, conforme o SNIS. No lixão, não há organização dos catadores que frequentam diariamente o espaço insalubre. Não há triagem de lixo reciclável. Nem impermeabilização do solo.
“No Marajó, é difícil ter uma área alta, e há cotas às vezes abaixo do nível do mar. E o lixão está perto de um corpo hídrico”, afirma o engenheiro ambiental Huan Tupinambá, diretor de Recursos Hídricos da Secretaria de Meio Ambiente de Breves.
Segundo Tupinambá, é muito provável que poços da área do lixão estejam contaminados. “A questão da água é muito complicada. Todas as famílias próximas do lixão dependem de poço”, diz.
O técnico afirma que deve haver mais logística reversa, com obrigação de vendedores e fabricantes cuidarem do destino dos resíduos, triagem de recicláveis e coleta seletiva. “É preciso aplicar tecnologias próprias nesses espaços.”
A matéria completa é da Folha de São Paulo e pode ser acessada pelo link a seguir: