Amazônia

Petróleo ameaça onças e maior manguezal do mundo na Amazônia

Ibama analisa pedido para exploração do combustível fóssil na costa da Foz do Amazonas. Especialistas alertam para riscos e catástrofe em caso de vazamento nesta região ainda pouca conhecida.

Chegadas e partidas da ilha de Maracá, na costa do Amapá, são complexas. Só os barqueiros mais experientes sabem o momento de atracar neste espaço de terra no Atlântico, influenciado por marés que sobem e descem até 12 metros duas vezes ao dia.

Eram 22h quando a reportagem se aproximou da margem, cruzando o igarapé Inferno, acompanhando servidores do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). A ilha é uma unidade de proteção integral, chamada de Estação Ecológica Maracá-Jipioca.

O trajeto naquela noite passaria pelo igarapé Purgatório. A expectativa era avistar os únicos moradores carnívoros permanentes da ilha: onças pintadas. Na escuridão, os olhos de coruja, jacaré e arapapá refletiam a luz da lanterna lançada na mata. Na água, algas bioluminescentes brilhavam como um pisca-pisca quando encontravam o casco do barco.

A ilha localizada na bacia marítima da Foz do Amazonas tem uma das maiores concentrações de onça pintada do mundo. Cerca de 175 quilômetros mar adentro, a indústria do petróleo aguarda liberação para abrir uma nova fronteira de exploração.

A situação preocupa quem vive, cuida e pesquisa a região, que tem as correntes marítimas mais fortes do país. Ainda não se sabe, por exemplo, qual seria o impacto na costa amazônica em caso de um vazamento de petróleo.

“Não existem estudos suficientes, nem embarcação apropriada. Um derramamento coincidindo com a maré cheia vai atingir os manguezais, os lagos, os campos inundados, seria impossível retirar este óleo”, diz Iranildo da Silva Coutinho, analista ambiental do ICMBio e chefe da Estação Ecológica Maracá-Jipioca.

Medo do impacto

O pedido para perfurar poços de petróleo na bacia marítima da Foz do Amazonas, também chamada de Margem Equatorial, está em análise. A brasileira Petrobrás tenta destravar a licença junto ao Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis (Ibama), depois da última negativa que recebeu, em maio de 2023.

O plano da petroleira prevê um investimento de 3,1 bilhões de dólares na região até 2028 e abertura de 16 poços – a começar pelo o FZA-M-59. Em 2018, a francesa Total, que também estava na corrida, desistiu da empreitada após a negativa do Ibama, na sequência da descoberta de um recife de corais até então desconhecido pela ciência.

Em Oiapoque, o município mais ao Norte do país, Luene Karipuna é a principal fonte de informação para seu povo sobre todo esse processo. Os moradores da Terra Indígena Juminá são os que estão mais próximos do bloco 59, a cerca de 140 a 150 quilômetros de distância do projeto.

“Há pouca informação. A propaganda diz que o empreendimento seria a salvação para todos os problemas, mas a gente não acredita. Temos medo de como seremos impactados, isso traz muita traz insegurança e dúvida para o território e para nossa costa”, diz Luene à DW, às margens do rio Flexal, na cidade de Amapá, base para acessar a ilha de Maracá.

Um mergulho no desconhecido

Luene acabara de desembarcar de uma expedição pela costa quando conversou com a DW. Ela passou dias a bordo do veleiro Witness, do Greenpeace, que navega por pontos estratégicos colhendo dados científicos e depoimentos dos moradores sobre esta região ainda desconhecida.

Luís Roberto Takiyama, pesquisador do Instituto de Pesquisas Científicas e Tecnológicas do Estado do Amapá (Iepa) também passou dias embarcado. Para investigar as correntes marítimas da região, ele soltou derivadores no mar, ou seja, boias de 20 centímetros que ficam na superfície e simulam a dispersão de poluentes.

“Já se sabe que há a possibilidade de um vazamento de petróleo chegar na costa. A ilha de Maracá, que é isolada, recebe muito lixo que vem do mundo todo, trazidos pelos ventos e correntes. Temos muita preocupação com esta área costeira, que tem as maiores marés do Brasil e a maior área contínua de manguezal do mundo”, explica Takiyama. “Nossa intenção é contribuir para aumentar o conhecimento”, adiciona.

A reportagem é da jornalista Nádia Pontes do site DW e pode ser acessada pelo link a seguir:

https://www.dw.com/pt-br/petr%C3%B3leo-amea%C3%A7a-on%C3%A7as-e-maior-manguezal-do-mundo-na-amaz%C3%B4nia/a-68667770
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