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Cota feminina de 10% de vagas em concurso da PM do Amazonas é derrubada no Supremo

Relator do processo considerou que a lei estadual produziu efeito oposto e limitou a participação das mulheres no certame

Por unanimidade, o Supremo Tribunal Federal (STF) derrubou trecho da Lei Estadual 5.671/2021, oriunda de um projeto do Governo do Amazonas, o qual instituía uma reserva de vagas para mulheres e estabelecia uma série de critérios de aptidão nos concursos da Polícia Militar do Estado.

A parte considerada inconstitucional é o caput do artigo 2º, bem como seu parágrafo 2º, que estabelecem:

“Art. 2º As etapas do concurso destinam-se a proporcionar uma avaliação precisa da capacidade e da aptidão do candidato ao ingresso na Polícia Militar, levando em consideração as exigências intelectuais, de saúde, de aptidão física, de conduta civil e psicológica, impostas pelas condições de execução do serviço militar estadual. § 2º Serão destinadas, no mínimo, 10% (dez por cento) das vagas previstas em concurso para os quadros de combatentes às candidatas do sexo feminino.”

A derrubada do trecho ocorre após a Procuradoria-Geral da República (PGR) entrar com uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI) contra o trecho específico da lei, afirmando ao STF que, embora a cota pudesse ser interpretada inicialmente como uma “política de ação afirmativa direcionada a favorecer, promover e ampliar o acesso” das mulheres a cargos públicos, a lei amazonense acabou por produzir o efeito oposto, excluindo as mulheres “da esmagadora maioria dos cargos disponíveis em quadros da aludida corporação, instituindo discriminação”.

“Isso porque, ao estabelecer que, no mínimo, 10% (dez por cento) das vagas oferecidas nos concursos para combatentes da Polícia Militar amazonense serão preenchidas por candidatas do sexo feminino, o dispositivo pode ser compreendido como autorização legal para que a participação de mulheres nos mesmos certames seja restrita e limitada a um percentual fixado nos editais dos concursos, impedindo-se que a totalidade das vagas sejam acessíveis por candidatas do sexo feminino”, escreve a PGR na ADI.

Procurados, o Governo do Amazonas e a Assembleia Legislativa do Amazonas (Aleam) se manifestaram contra a ação, defendendo que a legislação era constitucional.

A Assembleia considerou o entendimento da PGR como inútil, pois a existência da cota não impediria a participação feminina na ampla concorrência e pediu a extinção da ADI sem resolução do mérito.

Decisão

Em seu voto, o relator da ação, ministro Cristiano Zanin, concordou com os argumentos da PGR. O magistrado escreveu que, embora haja semelhança com legislações anteriores que também criaram reservas de vagas para grupos historicamente marginalizados, não concorda com as alegações de que “a natureza dos cargos da Polícia Militar exige requisitos diferenciados e mais restritos para a admissão de mulheres”.

Zanin pontua que a Assembleia Legislativa do Amazonas considerou necessária a imposição de critérios de idade, estatura e aptidão física, por se tratar de polícia ostensiva. A Aleam teria utilizado um exemplo hipotético:

“imaginando-se um cenário extremo, é bom para uma corporação militar que 100% dos aprovados para o cargo de soldado da Polícia Militar sejam mulheres? Até que ponto isso pode impactar a atuação da corporação, que não raro se envolve em embates físicos com manifestantes radicalizados torcedores de time de futebol, por exemplo?”.

Para o ministro, os legisladores estariam sugerindo que a maior participação de mulheres na corporação traria um pacto negativo. Zanin pontua que apesar de a Constituição permitir a imposição desses tipos de requisitos, “quando a natureza do cargo exigir”, é preciso que esteja especificado em lei, não “meramente presumidos”.

O ministro relembrou que a primeira versão do edital do concurso da Polícia Militar contia justamente a distorção na interpretação da lei apontada pela PGR, reservando 10% das vagas para mulheres e 90% para candidatos homens, reiterando que o Estado não pode estabelecer discriminações injustificáveis.

Em seu entendimento, o dispositivo viola a isonomia pregada pelo artigo 5º da Constituição Federal, a promoção do bem de todos e o combate à discriminação previstos no artigo 3º e os direitos dos trabalhadores previstos no artigo 7º.

“Posto isso, voto pela procedência da presente ação direta de inconstitucionalidade para conferir interpretação conforme a Constituição ao art. 2º, § 2º, da Lei 3.498, de 19 de abril de 2010, do Estado do Amazonas, na redação que lhe foi conferida pela Lei estadual 5.671, de 8 de novembro de 2021, a fim de se afastar qualquer exegese que admita restrição à participação de candidatas do sexo feminino nos concursos públicos para combatentes da corporação militar, sendo-lhes assegurado o direito de concorrer à totalidade das vagas oferecidas nos certames, para além da reserva de 10% (dez por cento) de vagas exclusivas, estabelecida pelo dispositivo que deve ser reconhecida como política de ação afirmativa”.

O entendimento foi seguido pelos demais membros do STF, ministros Edson Fachin, Nunes Marques, Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Luiz Fux, Alexandre de Moraes, André Mendonça, Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso.

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