Nas Entrelinhas

Governador de Roraima defende que os yanomami se integrem à vida nos centros urbanos

Associação yanomami diz que governador de Roraima Antonio Denarium (PP) tem visão colonizadora

Para o Ministério Público Federal a fala do governador de Roraima Antonio Denarium (PP)têm potencial discriminatório, conforme previsto no art. 20 da Lei nº 7.716/1989

Davi Kopenawa, que lidera a Hutukara Associação Yanomami,publicou nesta segunda-feira (30) uma nota em que repudia as falas do governador de Roraima, Antonio Denarium (PP), em entrevista ao jornal a Folha de São Paulo.

O governador disse que a crise que afeta os yanomamis não é exclusiva do estado, é restrita a alguns grupos e acontece há décadas da mesma forma. Ele também afirmou que não considera possível vincular o garimpo à situação dos indígenas e defendeu que eles se aculturem, ou seja, se integrem aos grandes centros urbanos.

Segundo a associação yanomami, falas do tipo denunciam o grau de preconceito e discriminação a que os indígenas estão sujeitos.

Na nota, Davi Kopenawa,afirma que os  modos de vida dos yanomami  são negados como se esses  povos fossem primitivos, incapazes, inumanos. Longe de se limitar ao discurso político, esse pensamento se refletiu em políticas de tendência genocida que foram implementadas sistematicamente nos últimos anos para inviabilizar a manutenção da vida dos yanomami”, afirma o texto.

Denarium é descrito na nota como “cúmplice da tragédia” por promover a atividade garimpeira na região. Segundo a atual ministra da Saúde, Nísia Trindade, o garimpo é a principal causa da crise sanitária dos indígenas de Roraima.

Na entrevista, o governador de Roraima, argumenta que: “Tenho 260 escolas em comunidades indígenas. Eles querem ser advogados, professores, médicos. Eu acho correto. Eles [indígenas] têm que se aculturar, não podem mais ficar no meio da mata, parecendo bicho. Eles têm que estar lá com condição, com estrada, escola, posto de saúde, fazendo agricultura deles, produzindo macaxeira, farinha”, disse Denarium.

A nota da Hutukara Associação Yanomami, diz ser necessário repudiar a visão colonizadora sobre os povos indígenas que os reduz a “animais, incapazes, ou qualquer subcategoria de sujeitos que devam se submeter aos modos de vida da cidade”.

“O povo Yanomami é um dos mais populosos povos indígenas de recente contato no mundo, e detentores de grande conhecimento ancestral sobre a floresta onde vivem. É nosso direito viver na floresta viva segundo nossos costumes, com saúde e vida”, conclui.

O Ministério Público Federal (MPF) avalia que as falas de governador de Roraima, Antonio Denarium, em entrevista à Folha de São Paulo, têm potencial discriminatório, conforme previsto no art. 20 da Lei nº 7.716/1989, ato passível de responsabilização cível e criminal.

A declaração em apuração refere-se ao trecho em que Denarium diz: “Eles [indígenas] têm que se aculturar, não podem mais ficar no meio da mata, parecendo bicho.” A afirmação ocorreu quando o governador respondia sobre os projetos que o governo do estado mantém na Terra Indígena Yanomami.

O procurador signatário ressalta que “as declarações do Governador Antonio Denarium literalmente no sentido de que os indígenas devem ‘se aculturar’ e que ‘não podem mais ficar no meio da mata, parecendo bicho’, além de ofender a imagem coletiva dos Yanomami, rotulando-os como ‘bichos’, expressam opinião depreciativa que implica, ao que parece, a conclusão de que os povos indígenas não podem viver seu modo de vida tradicional.”

O MPF instaurou inquérito para apurar a responsabilidade cível do Governo do Estado de Roraima. O documento foi encaminhado ainda ao procurador-geral da República, autoridade a quem cabe, caso vislumbre indícios de ato criminoso, instaurar apuração criminal de conduta e denunciar o governador do estado junto ao Superior Tribunal de Justiça, corte competente para a análise do caso.

O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal, determinou nesta segunda-feira (30/1) que seja investigada a possível participação de autoridades do governo Jair Bolsonaro (PL) na prática, em tese, de crimes — entre eles o de genocídio — contra comunidades indígenas.

No despacho, o ministro determinou a remessa à Procuradoria-Geral da República (PGR), ao Ministério Público Militar (MPM), ao Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJ) e à Superintendência Regional da Polícia Federal de Roraima de documentos que “sugerem um quadro de absoluta insegurança dos povos indígenas envolvidos, bem como a ocorrência de ação ou omissão, parcial ou total, por parte de autoridades federais”.

Entre os exemplos dessa prática, Barroso citou a publicação no Diário Oficial pelo então ministro da Justiça Anderson Torres de data e local de operação sigilosa de intervenção em terra indígena.

Ele mencionou ainda indícios de alteração do planejamento de uma operação da FAB, o que resultou em alerta aos garimpeiros. Para o ministro, as situações configuram “quadro gravíssimo e preocupante” e indicam a prática de múltiplos ilícitos.

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